O INÍCIO
Inicio a escrita destas Notas Marginais no dia 10 de outubro de 2009. Resisti bastante até convencer-me da importância do contato com um leitor virtual, invisível e distanciado, no entanto possível.
A PASSAGEM DO TEMPO
Não me vejo tendo nascido em outra província que não Pernambuco, e mais particularmente em Sertânia, antiga Alagoa de Baixo, no Sertão do Moxotó. Fui adotado pelo Recife, desde estudante do ensino médio, precisamente em 1973. Aos 16 anos, pensava que jamais iria envelhecer. Dez anos depois, fiz minha estreia na poesia, com o livreto Na solidão do neón. Um grande cortejo de amigos saudou esta primeira publicação. Coisa de que sinto falta hoje: tanta gente que se afastou, alguns de quem me afastei. A vida segue o seu curso enviesado, os amigos presentes e ausentes voltam ao pensamento com certa insistência.
O POETA E O ANONIMATO
O caracol não precisa de público, pois se encontra absurda e desumanamente centrado em si mesmo.
VIDA SOCIAL E VIDA LITERÁRIA
O dia-a-dia requer numerosos contatos humanos, uns mais constantes, outros esporádicos. Para ficar só e escrever torna-se mais raro, em certos instantes quase impossível, pelas obrigações e circunstâncias de sobrevivência que a vida impõe. Frequento, hoje, alguns eventos literários em ambientes fechados e, quando acontecem e não resisto ao chamamento, eventos de massa em via pública. Mas em dosagens que não me tornem em figura desgastada e desolada no redemoinho dos encontros fugazes ou na expectativa inútil da procura frustrada.
SOBRE O BRASIL
Um poema escrito pelo ex-exilado político Guilem Rodrigues da Silva, engajado mas humano o suficiente para comover mesmo quem não viveu aquela experiência ideológica:
SOBRE O BRASIL, MINHA PEQUENA – PARA MINHA FILHA NASCIDA NO EXÍLIO
Sobre o Brasil quero contar-te, minha pequena
a terra bem-amada
cheia de paz, de sol e de beleza
onde uma generosa natureza
desenhou rios, vales e montanhas.
No Brasil, minha pequena
são todos felizes
ali há justiça, trabalho, pão e escolas
a miséria e o analfabetismo
já não existem, pertencem ao passado.
Nenhum estudante desaparece nas cidades
não há mais presos políticos e reina a liberdade
as companhias estrangeiras não são mais proprietárias
dos nossos enormes recursos naturais
já não há mais golpes-de-Estado nem torturas
e em suas casernas e quartéis os nossos generais
esqueceram há muito os atos institucionais.
Para ti minha filhinha que nasceste no exílio
e brincaste na neve longe da nossa pátria
eu escrevo estes versos cheios de esperança.
Oxalá quando os leia no entardecer dos meus anos
não mais sejam quimera nem vã utopia
mas se eu te minto perdoa
quero apenas que durmas
embalada em meus sonhos.
SEMICLANDESTINO
Um encontro ansiado e secreto na noite. O contorno impreciso da gente com que se esbarra. O grupo que passa indiferente e distraído ao olhar mais aguçado. A torturante espera, o ridículo tenso da espreita. A despedida tardia e ligeira ao vento.
OSCAR WILDE
“Todos nós estamos na sarjeta, mas alguns de nós olham para as estrelas.” Nada pode definir melhor a vaidade e o orgulho do que um dito como este. Wilde era especialista em aforismos irônicos, inteligentes, envenenados. O orgulhoso de hoje pode vir a ser o mendigo de amanhã. Já vi alguns exemplos disto. O poderoso da hora pode vir a transformar-se no catador de doações aleatórias, subordinado a quem um dia causou constrangimentos e por vezes humilhou e retaliou. O destino entregue aos vermes, a solidão espectral dos cemitérios e a companhia muda de outros mortos será um experimento de todos.
JOSEPH BRODSKY
“Nenhuma poesia é escrita para o simples cômputo do que diz, assim como nenhuma vida é vivida para o cômputo do resumo necrológico.” Brodsky está falando aqui da boa poesia, daquela poesia que tem sobre o outro efeitos de prazer, emoção, vitalidade. Mesmo uma poesia considerada mórbida, sombria, pode arrancar o leitor de seu marasmo instantâneo, pela força da voz que ali se manifesta.
DUAL
A longa noite misteriosa da morte.
O breve e frágil sopro dos dias da vida.
quarta-feira, 28 de outubro de 2009
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